O paraíso no… Paraguai

Ao situar que a felicidade almejada por todos é inatingível, o escritor Mario Vargas Llosa se opõe aos seus principais personagens, Flora Tristan e o neto Paul Gauguin, do romance “O paraíso na outra esquina”, que sempre foram transgressores inconformados com a realidade vivida. Coisa de literatura, essa arte que desesperadamente tenta prender o tempo, entender e retratar nossos sonhos e desejos mais secretos por meio de palavras.

Agora, a levar em conta as palavras de um institucional do governo paraguaio difundido nas redes sociais, o paraíso não é tão distante e inatingível assim, fica ali no …Paraguai, país improvável, a levar em conta nosso imaginário latino-americano. Até hoje, para muitos, o Paraguai representa a meca dos “sacoleiros”, a treta, o contrabando de armas, uísque, cigarro, maconha etc. Igualmente é a terra dos rios, lagos, da guarânia, das harpas e canções falando da beleza da índia de cabelos negros como a noite que não tem luar. Mas sempre fica aquela sensação de que se trata de uma grande feira-livre anos-luz de um higienizado shopping.

Pois não é que o patinho feio, que pouco tinha a ofertar aos visitantes e investidores além da lagoa azul de Ypacarai, agora ganha corpo e ares de cisne. O institucional do governo aponta suas credenciais: primeiro maior produtor e exportador de energia hidrelétrica do mundo, único país tropical a exportar trigo, baixa carga tributária e muito incentivo fiscal, 84% da população com menos de 60 anos, 94% da população alfabetizada, baixa violência.

Também chamam atenção a evidência de fartura de água doce disponível sobre a terra e subsolo paraguaio – o aqüífero guarani – associada a uma topografia e clima “com baixo risco de desastres naturais”. Não é pouco, se levarmos em conta a crise hídrica que atravessamos no Sudeste brasileiro ou que Portugal, transformado nos últimos tempos em sonho de consumo de muitos brasileiros, agora enfrenta incêndios devastadores com assustador número de vítimas.

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Ali perto, na Inglaterra, um dos países mais visitados do mundo, há terroristas nas ruas, desunião geopolítica e incêndio em prédio residencial, como o registrado na Torre Grenfell, uma catástrofe típica de terceiro mundo e seus muquifos. Se levarmos em conta que incêndios com muitas vítimas são associados à imprudência e pobreza, seremos tentados a projetar que tanto Portugal quanto Inglaterra regridem na qualidade de vida. E que no outro extremo, ou seria esquina, o Paraguai evoluiu.

Naturalmente é preciso dar um bom desconto às propagandas. As institucionais, então, têm o poder de transformar qualquer vanguarda do atraso em prosperidade pujante. Vemos isso diariamente naqueles institucionais dos partidos políticos com suas mensagens edificantes levadas ao ar por caras e bocas que não inspiram mínima confiança. Ou, posto de outra forma, de quem você jamais compraria um carro usado.

Notamos isso ainda nos institucionais de governo exaltando obras e progresso quando a realidade ao redor está longe do paraíso prometido. Nas voltas que o mundo dá, em certa esquina latino-americana, o sonho agora é virar um imenso Paraguai.

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